01. (UERJ 2016)
A ARTE DE ENGANAR
Em
seu livro Pernas pro ar, Eduardo Galeano recorda que, na era vitoriana,
era proibido mencionar “calças” na presença de uma jovem. Hoje em dia, diz ele,
não cai bem utilizar certas expressões perante a opinião pública: “O
capitalismo exibe o nome artístico de economia de mercado; imperialismo se
chama globalização; suas vítimas se chamam países em via de desenvolvimento;
oportunismo se chama pragmatismo; 1despedir sem indenização nem
explicação se chama flexibilização laboral” etc.
A
lista é longa. Acrescento os inúmeros preconceitos que carregamos: ladrão é
sonegador; lobista é consultor; fracasso é crise; especulação é derivativo; 2acumulação
privada de riqueza é democracia; socialização de bens é ditadura; governar a
favor da maioria é populismo; tortura é constrangimento ilegal.
Eufemismo
é a arte de dizer uma coisa e acreditar que o público escuta ou lê outra. É um
jeitinho de escamotear significados. De tentar encobrir verdades e realidades.
Posso
admitir que pertenço à terceira idade, embora esteja na cara: sou velho. 3Ora,
poderia dizer que sou seminovo! Como carros em revendedoras de veículos. Todos
velhos! Mas o adjetivo seminovo os torna mais vendáveis.
Coitadas
das palavras! Elas 4são distorcidas para que a realidade,
escamoteada, permaneça como está. Não conseguem, contudo, escapar da luta de
classes: pobre é ladrão, rico é corrupto.
Em
suma, eufemismo é um truque semântico para tentar amenizar os fatos.
Frei Betto.
Adaptado de O Dia, 21/03/2015.
a) despedir sem indenização nem explicação se
chama flexibilização laboral (ref. 1)
b) acumulação privada de riqueza é democracia;
(ref. 2)
c) Ora, poderia dizer que sou seminovo! (ref. 3)
d) são distorcidas para que a realidade, escamoteada, permaneça como está. (ref. 4)
02. (UERJ 2012)
Sobre a origem da poesia
A origem da
poesia se confunde com a origem da própria linguagem.
Talvez fizesse
mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia. Ou: qual
a origem do discurso não poético, já que, restituindo laços mais íntimos entre
os signos e as coisas por eles designadas, a poesia aponta para um uso muito
primário da linguagem, que parece anterior ao perfil de sua ocorrência nas
conversas, nos jornais, nas aulas, conferências, discussões, discursos, ensaios
ou telefonemas.
Já perdemos a
inocência de uma linguagem plena assim. As palavras se desapegaram das coisas,
assim como os olhos se desapegaram dos ouvidos, ou como a criação se desapegou
da vida. Mas temos esses pequenos oásis − os poemas − contaminando o deserto da
referencialidade.
ARNALDO ANTUNES.
www.arnaldoantunes.com.br
Na frase acima, o emprego das palavras “oásis”
e “deserto” configura uma superposição de
figuras de linguagem, recurso frequente em
textos artísticos. As figuras de linguagem superpostas na frase são:
b) ironia e metonímia
c) elipse e comparação
d) personificação e hipérbole
03.
(UERJ
2017)
Pietro Brun,
meu tetravô paterno, embarcou em um navio no final do século 19, como tantos
italianos pobres, em busca de uma utopia que atendia pelo nome de América.
Pietro queria terra, sim. Mas o que o movia era um território de outra ordem.
Ele queria salvar seu nome, encarnado na figura de meu bisavô, Antônio. Pietro
fora obrigado a servir o exército como soldado por anos demais (...). Havia
chegado a hora de Antônio se alistar, e o pai decidiu que não perderia seu
filho. Fugiu com ele e com a filha Luigia para o sul do Brasil. Embarcou como
clandestino.
Ao
desembarcar no Brasil, em 10 de fevereiro de 1883, Pietro declarou o nome
completo. O funcionário do Império, como aconteceu tantas e tantas vezes,
registrou-o conforme ouviu. Tornando-o, no mundo novo, Brum – com “m”. Meu pai,
Argemiro, filho de José, neto de Antônio e bisneto de Pietro, tomou para si a
missão de resgatar essa história e documentá-la.
Ao fugir
para o Brasil, metade dos Brun ganhou uma perna a mais. O “n” virou “m”. Mas
essa perna a mais era um membro fantasma, um ganho que revelava uma perda.
Quando
Pietro Brun atravessou o mar deixando mortos e vivos na margem que se
distanciou, ele não poderia ser o mesmo ao alcançar o outro lado. Ele tinha de
ser outro, assim como nós, que resultamos dessa aventura desesperada. Era
imperativo que ele fosse Pietro Brum – e depois até Pedro Brum.
ELIANE BRUM. Meus desacontecimentos: a história da minha vida com
as palavras. São Paulo: LeYa, 2014.
“Ao fugir para
o Brasil, metade dos Brun ganhou uma perna a mais. O “n” virou “m”. Mas essa
perna a mais era um membro fantasma, um ganho que revelava uma perda. (3º parágrafo)
b) metáfora
c) hipérbole
d) eufemismo
Ciência e Hollywood
Infelizmente, é
verdade: explosões não fazem barulho algum no espaço. Não me lembro de um só
filme que tenha retratado isso direito. Pode ser que existam alguns, mas se
existirem não fizeram muito sucesso. Sempre vemos explosões gigantescas,
estrondos fantásticos. Para existir ruído é necessário um meio material que
transporte as perturbações que chamamos de ondas sonoras. Na ausência de
atmosfera, ou água, ou outro meio, as perturbações não têm onde se propagar.
Para um produtor de cinema, a questão não passa pela ciência. Pelo menos não
como prioridade. Seu interesse é tornar o filme emocionante, e explosões têm
justamente este papel; roubar o som de uma grande espaçonave explodindo torna a
cena bem sem graça.
MARCELO GLEISER.
Adaptado de www1.folha.uol.com.br.
b) hipérbole
c) metonímia
d) eufemismo
05.
(FGV
2015)
Uma
tia-avó
Fico abismada de ver de quanta coisa não me lembro. Aliás, não me
lembro de nada.
Por exemplo, as férias em que eu ia para uma cidade do interior de Minas, onde tinha uma tia-avó.
Não poderia repetir o rosto dela, sei que muito magra, vestido até o chão, 1fantasma em cinzentos, levemente muda, deslizando por 2corredores de portas muito altas.
O clima da casa era de passado 3embrulhado em papel de seda
amarfanhado, e posto no canto para que não se atrevesse a voltar à tona. Nem um
riso, 4um barulho de copos tinindo. Quem estava ali sabia que quanto
menos se mexesse menor o perigo de sofrer. Afinal o mundo era um 5vale
de lágrimas.
Nem precisava ser sensível para sentir a secura, a geometria
esturricada dos canteiros 6sob o céu de anil de Minas. Nada, nem uma
flor, só coisas que espetavam.
Para mim, pareciam uvas de chocolate, recheadas de bebida, mas não
tinha coragem de pedir, estavam lá ano após ano, intocadas. A avó, baixinho,
permitia, “Quer, pode pegar”, com voz neutra, mas eu declinava, 7doida
de desejo.
Enfim, Belo Horizonte para mim era uma terra triste, de 8mulheres
desesperadas e mudas enterradas no tempo, 9chocolates sedutores e
proibidos. Só valia como passagem para a 10roça brilhante de sol que
me esperava.
Nina Horta, Folha de S. Paulo,
17/07/2013. Adaptado.
a) “corredores de portas muito altas” (ref. 2);
“fantasma em cinzentos” (ref. 1).
b) “vale de lágrimas” (ref. 5); “passado embrulhado
em papel de seda” (ref. 3).
c) “doida de desejo” (ref. 7); “um barulho de
copos tinindo” (ref. 4).
d) “mulheres desesperadas” (ref. 8); “sob o céu
de anil de Minas” (ref. 6).
e) “roça brilhante de sol” (ref. 10);
“chocolates sedutores e proibidos” (ref. 9).
06. (PUC - RJ 2015)
Trecho de entrevista dada
pelo escritor uruguaio Eduardo Galeano ao jornalista Eric Nepomuceno no
programa Sangue Latino.
a) No texto, o entrevistado fez uso de duas metáforas
na última frase da sua fala. Identifique essas metáforas e explique o sentido
que elas assumem no texto.
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07. (CEDERJ
2016)
Gorjeios
- Manoel de Barros
Gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se inclui a sedução. É quando a pássara está enamorada que ela gorjeia. Ela se enfeita e bota novos meneios na voz. Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado. É por isso que as árvores ficam loucas se estão gorjeadas. É por isso que as árvores deliram. Sob o efeito da sedução da pássara as árvores deliram. E se orgulham de terem sido escolhidas para o concerto. As flores dessas árvores depois nascerão mais perfumadas.
Para expressar a beleza do gorjeio da pássara, no verso “Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado”, é utilizado o seguinte recurso:
(B) Comparação.
(C) Metonímia.
(D) Hipérbole.