domingo, 9 de fevereiro de 2025

FIGURAS DE LINGUAGEM


01.   (UERJ 2016)

A ARTE DE ENGANAR

                Em seu livro Pernas pro ar, Eduardo Galeano recorda que, na era vitoriana, era proibido mencionar “calças” na presença de uma jovem. Hoje em dia, diz ele, não cai bem utilizar certas expressões perante a opinião pública: “O capitalismo exibe o nome artístico de economia de mercado; imperialismo se chama globalização; suas vítimas se chamam países em via de desenvolvimento; oportunismo se chama pragmatismo; 1despedir sem indenização nem explicação se chama flexibilização laboral” etc.

                A lista é longa. Acrescento os inúmeros preconceitos que carregamos: ladrão é sonegador; lobista é consultor; fracasso é crise; especulação é derivativo; 2acumulação privada de riqueza é democracia; socialização de bens é ditadura; governar a favor da maioria é populismo; tortura é constrangimento ilegal.

                Eufemismo é a arte de dizer uma coisa e acreditar que o público escuta ou lê outra. É um jeitinho de escamotear significados. De tentar encobrir verdades e realidades.

                Posso admitir que pertenço à terceira idade, embora esteja na cara: sou velho. 3Ora, poderia dizer que sou seminovo! Como carros em revendedoras de veículos. Todos velhos! Mas o adjetivo seminovo os torna mais vendáveis.

                Coitadas das palavras! Elas 4são distorcidas para que a realidade, escamoteada, permaneça como está. Não conseguem, contudo, escapar da luta de classes: pobre é ladrão, rico é corrupto.

                Em suma, eufemismo é um truque semântico para tentar amenizar os fatos.

Frei Betto. Adaptado de O Dia, 21/03/2015.

 Na produção do humor, traço típico da crônica, o autor combina eufemismos com outros recursos ou figuras de linguagem. O exemplo em que o humor é produzido por meio da superposição entre um eufemismo e uma comparação entre elementos distintos é:

a) despedir sem indenização nem explicação se chama flexibilização laboral (ref. 1)   

b) acumulação privada de riqueza é democracia; (ref. 2)   

c) Ora, poderia dizer que sou seminovo! (ref. 3)   

d) são distorcidas para que a realidade, escamoteada, permaneça como está. (ref. 4)

 

02.   (UERJ 2012)

Sobre a origem da poesia

A origem da poesia se confunde com a origem da própria linguagem.

Talvez fizesse mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia. Ou: qual a origem do discurso não poético, já que, restituindo laços mais íntimos entre os signos e as coisas por eles designadas, a poesia aponta para um uso muito primário da linguagem, que parece anterior ao perfil de sua ocorrência nas conversas, nos jornais, nas aulas, conferências, discussões, discursos, ensaios ou telefonemas.

Já perdemos a inocência de uma linguagem plena assim. As palavras se desapegaram das coisas, assim como os olhos se desapegaram dos ouvidos, ou como a criação se desapegou da vida. Mas temos esses pequenos oásis − os poemas − contaminando o deserto da referencialidade.

ARNALDO ANTUNES. www.arnaldoantunes.com.br

 “Mas temos esses pequenos oásis os poemas contaminando o deserto da referencialidade.” (último parágrafo)

 

Na frase acima, o emprego das palavras “oásis” e “deserto” configura uma superposição de

figuras de linguagem, recurso frequente em textos artísticos. As figuras de linguagem superpostas na frase são:

 a) metáfora e antítese   

b) ironia e metonímia   

c) elipse e comparação   

d) personificação e hipérbole   


 

03.   (UERJ 2017)

Pietro Brun, meu tetravô paterno, embarcou em um navio no final do século 19, como tantos italianos pobres, em busca de uma utopia que atendia pelo nome de América. Pietro queria terra, sim. Mas o que o movia era um território de outra ordem. Ele queria salvar seu nome, encarnado na figura de meu bisavô, Antônio. Pietro fora obrigado a servir o exército como soldado por anos demais (...). Havia chegado a hora de Antônio se alistar, e o pai decidiu que não perderia seu filho. Fugiu com ele e com a filha Luigia para o sul do Brasil. Embarcou como clandestino.

Ao desembarcar no Brasil, em 10 de fevereiro de 1883, Pietro declarou o nome completo. O funcionário do Império, como aconteceu tantas e tantas vezes, registrou-o conforme ouviu. Tornando-o, no mundo novo, Brum – com “m”. Meu pai, Argemiro, filho de José, neto de Antônio e bisneto de Pietro, tomou para si a missão de resgatar essa história e documentá-la.

Ao fugir para o Brasil, metade dos Brun ganhou uma perna a mais. O “n” virou “m”. Mas essa perna a mais era um membro fantasma, um ganho que revelava uma perda.

Quando Pietro Brun atravessou o mar deixando mortos e vivos na margem que se distanciou, ele não poderia ser o mesmo ao alcançar o outro lado. Ele tinha de ser outro, assim como nós, que resultamos dessa aventura desesperada. Era imperativo que ele fosse Pietro Brum – e depois até Pedro Brum.

ELIANE BRUM. Meus desacontecimentos: a história da minha vida com as palavras. São Paulo: LeYa, 2014.

 

“Ao fugir para o Brasil, metade dos Brun ganhou uma perna a mais. O “n” virou “m”. Mas essa perna a mais era um membro fantasma, um ganho que revelava uma perda. (3º parágrafo)

 A autora associa a troca de letras no registro do sobrenome de seu tetravô à expressão um membro fantasma. Essa associação constrói um exemplo da figura de linguagem denominada:

 a) antítese   

b) metáfora   

c) hipérbole   

d) eufemismo   


 04.   (UERJ 2013)

Ciência e Hollywood

Infelizmente, é verdade: explosões não fazem barulho algum no espaço. Não me lembro de um só filme que tenha retratado isso direito. Pode ser que existam alguns, mas se existirem não fizeram muito sucesso. Sempre vemos explosões gigantescas, estrondos fantásticos. Para existir ruído é necessário um meio material que transporte as perturbações que chamamos de ondas sonoras. Na ausência de atmosfera, ou água, ou outro meio, as perturbações não têm onde se propagar. Para um produtor de cinema, a questão não passa pela ciência. Pelo menos não como prioridade. Seu interesse é tornar o filme emocionante, e explosões têm justamente este papel; roubar o som de uma grande espaçonave explodindo torna a cena bem sem graça.

MARCELO GLEISER. Adaptado de www1.folha.uol.com.br.

 No título do texto, a palavra Hollywood é empregada por causa da identificação entre a indústria cinematográfica e uma localidade dos Estados Unidos que concentra empresas do ramo. Esse emprego, portanto, configura uma figura de linguagem conhecida como:

 a) metáfora   

b) hipérbole   

c) metonímia   

d) eufemismo   



05.  
(FGV 2015)

Uma tia-avó

Fico abismada de ver de quanta coisa não me lembro. Aliás, não me lembro de nada.

Por exemplo, as férias em que eu ia para uma cidade do interior de Minas, onde tinha uma tia-avó.

Não poderia repetir o rosto dela, sei que muito magra, vestido até o chão, 1fantasma em cinzentos, levemente muda, deslizando por 2corredores de portas muito altas.

O clima da casa era de passado 3embrulhado em papel de seda amarfanhado, e posto no canto para que não se atrevesse a voltar à tona. Nem um riso, 4um barulho de copos tinindo. Quem estava ali sabia que quanto menos se mexesse menor o perigo de sofrer. Afinal o mundo era um 5vale de lágrimas.

Nem precisava ser sensível para sentir a secura, a geometria esturricada dos canteiros 6sob o céu de anil de Minas. Nada, nem uma flor, só coisas que espetavam.

Para mim, pareciam uvas de chocolate, recheadas de bebida, mas não tinha coragem de pedir, estavam lá ano após ano, intocadas. A avó, baixinho, permitia, “Quer, pode pegar”, com voz neutra, mas eu declinava, 7doida de desejo.

Enfim, Belo Horizonte para mim era uma terra triste, de 8mulheres desesperadas e mudas enterradas no tempo, 9chocolates sedutores e proibidos. Só valia como passagem para a 10roça brilhante de sol que me esperava.

Nina Horta, Folha de S. Paulo, 17/07/2013. Adaptado.

 Embora tenha sido publicado em jornal, o texto contém recursos mais comuns na linguagem literária do que na jornalística. Exemplificam tais recursos a hipérbole e a metáfora, que ocorrem, respectivamente, nos seguintes trechos:

a) “corredores de portas muito altas” (ref. 2); “fantasma em cinzentos” (ref. 1).   

b) “vale de lágrimas” (ref. 5); “passado embrulhado em papel de seda” (ref. 3).   

c) “doida de desejo” (ref. 7); “um barulho de copos tinindo” (ref. 4).   

d) “mulheres desesperadas” (ref. 8); “sob o céu de anil de Minas” (ref. 6).   

e) “roça brilhante de sol” (ref. 10); “chocolates sedutores e proibidos” (ref. 9).   

 

06.   (PUC - RJ 2015)

 Entrevistador: - Queria que você falasse um pouquinho sobre uma coisa que eu sei que é muito importante pra você, a amizade.

 Galeano: Sim, a amizade é uma forma de amor. E como dizia pra você, acho que se exerce na base da honestidade, porque a outra amizade, a amizade do “amo muito você” e “que lindo você é” não é a verdadeira amizade. Os amigos, quando são amigos de verdade, dizem o que se deve dizer, e isso diz respeito a processos coletivos também. Então, amizade às vezes é difícil sobre essa base, porque atravessa períodos complicados. Mas quando a gente ama de verdade, no amor, na amizade, ama as luzes e as sombras de cada pessoa ou de cada lugar.

 

Trecho de entrevista dada pelo escritor uruguaio Eduardo Galeano ao jornalista Eric Nepomuceno no programa Sangue Latino.

 

a)      No texto, o entrevistado fez uso de duas metáforas na última frase da sua fala. Identifique essas metáforas e explique o sentido que elas assumem no texto.

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07.   (CEDERJ 2016)

 

Gorjeios - Manoel de Barros

Gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se inclui a sedução. É quando a pássara está enamorada que ela gorjeia. Ela se enfeita e bota novos meneios na voz. Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado. É por isso que as árvores ficam loucas se estão gorjeadas. É por isso que as árvores deliram. Sob o efeito da sedução da pássara as árvores deliram. E se orgulham de terem sido escolhidas para o concerto. As flores dessas árvores depois nascerão mais perfumadas.

Para expressar a beleza do gorjeio da pássara, no verso “Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado”, é utilizado o seguinte recurso:

 (A) Metáfora.

(B) Comparação.

(C) Metonímia.

(D) Hipérbole.

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